sábado, 20 de novembro de 2021

Eletrônica Analógica: Introdução ao Diodo

  


 Objetivos: 

Ganhar afinidade com as características dos principais materiais semi-condutores: Silício (Si), Germânio (Ge) e GaAs; 

Entender os princípios básicos da física de semicondutores; 

Descrever as diferenças entre materiais do tipo P e tipo N; 

Compreender o funcionamento básico de um diodo.

 

 Você sabia que as mais variadas tecnologias que nos cercam diariamente são baseadas em princípios físicos que conhecemos desde muitas décadas atrás? Mais precisamente, as teorias que descobrimos lá no início do século XX continuam sendo os pilares dos dispositivos eletrônicos de hoje!Em 1965,Dr. Gordon E. Moore apresentou um artigo em que previa que o número de transistores dentro de um circuito integrado iria dobrar a cada dois anos. Hoje, cerca de 50 anos depois, as previsões de Moore continuam, surpreendentemente, precisas! E deve continuar por mais algumas décadas. 

Contudo, existem quatro fatores que podem limitar a miniaturização de circuitos eletrônicos. São eles: a qualidade do material semicondutor; as técnicas de projetos da topologia dos circuitos; as limitações dos atuais métodos de fabricação e por último, mas não menos importante, a vontade e espirito inovador da indústria de semicondutores. 

Aqui, iremos, inicialmente, entender o funcionamento dos componentes elementares que formam um dispositivo eletrônico. A saber, o diodo, o transistor bipolar (BJT) e o transistor de efeito de campo (FET/MOSFET). 

Começaremos nossa jornada pelo componente mais simples, o Diodo. E veremos que apesar de ser o componente mais simples, possui um enorme número de aplicações. Para isso, primeiro devemos aprender um pouco sobre as características dos materiais no quais são fabricados assim como as leis físicas básicas que regem os circuitos elétricos.

 Materiais Semicondutores

 A construção qualquer dispositivo eletrônico de estado-sólido começa com um material semicondutor de alta pureza. Os materiais semicondutores são definidos a seguir.

"O semicondutor é uma classe especial de material que se situa entre materiais condutores e isolantes"

  Lembre que os materiais condutores são aqueles que possuem, naturalmente, elétrons livres em sua estrutura, de forma que ao serem submetidos a uma diferença de potencial (d.d.p.) surge uma corrente elétrica (E.x.: cobre e ouro). A animação a seguir ilustra um material condutor. Clique no interruptor para ligar/desligar!

V + - E
Note que quando a chave é fechada (click nela) os elétrons livres passam a ter uma trajetória definida pelo campo elétrico fornecido pela fonte de tensão.

 Por outro lado, os isolantes são materiais que não possuem elétrons livres em quantidade suficiente para formar uma corrente elétrica, portanto, mesmo quando submetidos a uma diferença de potencial (d.d.p.) não apresentam circulação de corrente elétrica (E.x.: madeira e plástico).

 Já os semicondutores possuem mais elétrons livres que materiais isolantes, porém, menos que os condutores. Dessa forma, os semicondutores são classificados como maus condutores de eletricidade. 

Existem, basicamente, duas categorias de semicondutores: os do tipo cristal-único e os compostos. Por exemplo, Silício (Si) e Germânio (Ge) são semicondutores do tipo cristal-único. Arsenieto de Gálio (GaAs) e Sulfeto de Cádmio (CdS) são exemplos de semicondutores compostos, pois são formados por dois ou mais materiais semicondutores com estruturas atômicas distintas.

 Apesar de existirem vários semicondutores, os mais utilizados para a fabricação de dispositivos eletrônicos são:

• Silício (Si);
• Germânio (Ge);
• Arsenieto de Gálio (GaAs). 

É interessante apontar que, inicialmente, o Germânio era o material mais utilizado para fabricação de diodos e transistores por sua abundância e simplicidade de obtenção em altos níveis de pureza. Porém, o Germânio apresenta grande sensibilidade a temperatura. Dessa forma, os pesquisadores perceberam que ao utilizar Silício ao invés de Germânio os diodos e transistores passavam a ter menos sensibilidade à temperatura. Desse modo, o Silício
se tornou o material mais utilizado nas fabricações eletrônicas nas últimas décadas.

Contudo, nos últimos anos, a indústria eletrônica passou a ter uma nova demanda: velocidade. Assim, se torna desejável que os materiais semicondutores possuam capacidade de oferecer altos níveis de velocidade de operação. Com isso, surgiram novos materiais semicondutores como o Arsenieto de Gálio (GaAs). Um transistor feito de GaAs pode operar até 5x mais rápido
que um transistor feito com Silício!

Camada de Valência

Para entender os benefícios de se usar o Silício ou Germânio, primeiro devemos entender um pouco da estrutura atômica desses materiais.




Note que tanto o Silício quanto Germânio possui 4 elétrons na última camada, portanto, são elementos tetravalentes. A última camada também recebe o nome de Camada de Valência.

A diferença da camada de valência para as demais é que nessa camada é necessário apenas uma pequena quantidade de energia para remover os elétrons. Dessa forma, um campo elétrico de baixa intensidade, por exemplo, pode ser suficiente para retirar os elétrons e formar uma corrente elétrica.  

No entanto, os átomos dos materiais não ficam isolados, mas sim agrupados formando uma estrutura cristalina.

Se o material for de alta pureza (apenas átomos de silício) então teremos uma estrutura parecida com a seguinte ilustração. 


Note que os elétrons da camada de valência formam ligações com os elétrons dos átomos vizinhos (ligação covalente). Desse modo, não restam elétrons livres, de forma natural, para uma eventual corrente elétrica. Por isso, o silício em sua forma intrínseca (pura) é um péssimo condutor de eletricidade. Contudo, da Física Atômica, sabemos que mesmo para elétrons envolvidos numa ligação covalente, caso seja fornecido energia suficiente é possível retirar o elétron da camada de valência e levar para a camada de condução. A próxima seção apresenta maiores detalhes desse fenômeno.


Níveis de Energia

Cada estrutura atômica possuem um determinado nível de energia em que é necessário para que um elétron possa ser arrancado de sua órbita. Essa energia pode ser fornecida de diferentes formas, como exemplo: calor ou campo elétrico.

É importante apontar que na física atômica a energia é quantizada, portanto, existem valores discretos em que definem o GAP energético entre duas camadas. Para o contexto de dispositivos eletrônicos, o GAP mais importante é aquele entre a banda de valência e a banda de condução.
 
Com a noção de níveis de energia em mente, podemos definir de forma mais consistente as diferenças entre materiais condutores, semicondutores e isolantes.
        
O material isolante é aquele que apresenta um GAP entre a banda de valência e a banda de condução muito grande, portanto, é necessária uma quantidade enorme de energia para arrancar elétrons.


Já o condutor, apresenta banda de valência sobreposta a banda de condução, dessa forma, qualquer pertubação externa (e.x. campo elétrico) é suficiente para arrancar elétrons.


Por fim, o semicondutor é aquele material que apresenta um nível intermediário de GAP entre a banda de valência e condução. Dessa forma, com o fornecimento de um certo nível de energia não muito grande, é possível arrancar elétrons da banda de valência para banda de condução.   


A energia mínima para arrancar um elétron da banda de valência para o Ge, Si e GaAs são:

Ge -->     0.67eV

Si -->     1.11eV

GaAs --> 1.43eV


Lembrando que $1eV=1.6\times 10^{-19}C$. 

Dopagem

As características elétricas dos semicondutores podem ser alteradas drasticamente com a inclusão de impurezas. O processo de incluir impurezas ao semicondutor é chamado Dopagem.

A dopagem consiste, basicamente, em adicionar algum elemento com estrutura atômica conveniente de forma que ao final resulte em um composto com mais portadores de cargas (elétrons livres ou buracos). 

Dois dos elementos mais utilizados para a dopagem são: Fósforo (P) e Boro (B).



O material dopado é chamado material extrínseco. Existem duas categorias de materiais extrínsecos de suma importância para eletrônica, o material do tipo-N e tipo-P.

Material do tipo-N

Tanto os materiais do tipo-N quanto do tipo-P são formados através da adição de um determinado número de átomos de impureza ao material base.

Como exemplo, considere o Silício como material base. Desse modo, para produzir um material do tipo-N, pode-se adicionar átomos com 5 elétrons em suas camadas de valência como impureza, ou seja, átomos pentavalentes. Alguns exemplos de átomos pentavalentes são: fósforo, arsênico e antimônio.    
        
O efeito da adição de um átomo de Fósforo como impureza ao Silício é ilustrado na Figura abaixo.        


Note que pelo fato de o átomo de Fósforo possuir 5 elétrons na sua camada de valência e o Silício precisar de somente 4 elétrons para formar um grupo cristalino, ao final sobra um elétron que fica passeando pelo material! Dessa forma, o Silício passa ter uma quantidade maior de elétrons, assim, esse material é chamado tipo-N.

 Além disso, pelo fato de o Fósforo ter doado um elétron de sua camada de valência, ele é chamado Átomo Doador.

 É importante deixar claro que apesar do material tipo-N possuir mais elétrons livres, do ponto de vista de carga, o material continua neutro. Pois, a soma das cargas negativas dos elétrons livres com as cargas positivas dos prótons presentes no núcleo continua resultando em zero.

Material do tipo-P

Da mesma forma que o material do tipo-N, para obter material do tipo-P deve-se adicionar alguma impureza de forma ao final obter uma estrutura com os portadores de cargas desejados. No caso do material tipo-P, deve-se adicionar átomos com apenas três elétrons em sua camada de valência, ou seja, átomos tetravalentes. Alguns exemplos de átomos tetravalentes são: Gálio, Índio e Boro. A Figura a seguir ilustra o efeito da adição do átomo de Boro a uma base de Silício.

Note que pelo fato de o átomo de Boro ter apenas três elétrons em sua camada de valência, a estrutura final fica faltando um elétron para formar a estrutura cristalina do Silício. Esse espaço vazio é chamado buraco.

Desse modo, os materiais que apresentam buracos em sua estrutura possuem falta de elétron, portanto, são chamados materiais tipo-P. Caso um elétron livre passe por perto desse buraco, o elétron tenderá a ocupar este espaço vazio. Dessa forma, o átomo de Boro é chamado Átomo receptor.

Pode ocorrer também de os elétrons das camadas de valência próximos ao buraco serem atraídos criando um deslocamento do buraco pela estrutura. Lembre, no entanto, que apesar de existir falta de elétrons na estrutura, o material tipo-P permanece eletricamente neutro, da mesma forma que o material tipo-N.

Resistência vs Temperatura

Uma característica interessante dos semicondutores é sua dependência com a temperatura. Diferentemente dos condutores, em que um aumento na temperatura provoca um aumento na resistência, os materiais semicondutores possuem coeficiente negativo de temperatura! Isso significa que um aumento na temperatura reduz a resistência do semicondutor.

           

Portadores Majoritários e Minoritários

Na prática, mesmo quando um material semicondutor intrínseco possui níveis elevados de pureza, alguns elétrons das camadas de valência podem por ventura receber energia cinética suficiente para romper suas ligações, dessa forma, os materiais intrínsecos podem possuir uma certa quantidade tanto de elétrons livres quanto de buracos.

        
Porém, quando um material intrínseco é dopado para obter um material do tipo-N, o número de elétrons livres se torna expressivamente maior do que o de buracos. Desse modo, no material tipo-N, verifica-se que os portadores Majoritários são elétrons livres e os portadores Minoritários são os buracos remanescentes do material intrínseco.
        
Por outro lado, quando um material intrínseco é dopado para obter um material do tipo-P, o número de buracos aumenta expressivamente e restam apenas poucos elétrons livres.
Assim, no material tipo-P, verifica-se que os portadores Majoritários são buracos e o portadores Minoritários  são os elétrons livres.

Os materiais do tipo-P e do tipo-N formam os blocos elementares para a construção dos dispositivos eletrônicos!    

Junção PN

Um fenômeno interessante ocorre quando juntamos um material do tipo-P com um do tipo-N. No instante em que esses dois materiais são unidos, os elétrons livres do material tipo-N e os buracos do tipo-P começam a se combinar resultando em uma região sem portadores de cargas livres e, consequentemente, uma região levemente polarizada. Essa região é chamada Depleção.

Essa leve diferença de carga que ocorre na junção faz com que surja uma diferença de potencial (d.d.p) entre o material tipo-P e tipo-N. Essa d.d.p atua como uma barreira para os elétrons livres, desse modo, caso um elétron livre do material tipo-N tente se aproximar da região de Depleção ele é repelido.   

Porém, caso seja conectado uma fonte de tensão à junção de forma que o material tipo-P fique em contato com o polo positivo da fonte, então essa d.d.p da Depleção é atenuada. Assim, para tensões acima de um certo limiar (cerca de 0.7V para Silício), os elétrons livres do material tipo-N começam a atravessar para o material tipo-P formando uma corrente elétrica. Esse estado é chamado polarização direta.

Por outro lado, caso o polo positivo da fonte esteja em contato com o material tipo-N, então a barreira na Depleção tende a aumentar e os elétrons livres passam a ter ainda mais dificuldade em atravessar para o material tipo-P. Esse estado é chamado polarização reversa.

Para esta junção PN é dado o nome de Diodo, o mais simples dos dispositivos eletrônicos. Usualmente, o diodo será simbolizado por uma flecha indicando o sentido convencional da corrente elétrica, conforme Figura abaixo.


 

Bons estudos!

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